Novos tempos, velhos hábitos

Em novos tempos para a República Federativa do Brasil com a eleição de Dilma Rousseff para presidente, vale a pena relembrar o trecho de uma circular, datada de 1794, direcionada aos funcionários públicos da França.
Embora já tenhamos percorrido 216 anos de história, infelizmente, o que a circular francesa preconizava ainda está longe de ser uma realidade na maior parte das nações instituídas e, em especial, na antiga colônia portuguesa.
O trecho abaixo é citado na obra "A linguagem da política", de Harold Lasswell e Abraham Kaplan, publicado pela EUB, em 1979.
Eis a peça:
"O funcionário público, acima de tudo, deve desfazer-se da roupagem antiga e abandonar a polidez forçada, tão inconsistente com a postura de homens livres, e que é uma relíquia do tempo em que alguns homens eram ministros e outros, seus escravos.
Sabemos que as velhas formas de governo já desapareceram: devemos até esquecer como eram. As maneiras simples e naturais devem substituir a dignidade artificial que frequentemente constituía a única virtude de um chefe de departamento ou outro funcionário graduado.
Decência e genuína seriedade são os requisitos exigidos de homens dedicados à coisa pública. A qualidade essencial do Homem na Natureza consiste em ficar de pé.
O jargão ininteligível dos velhos ministérios deve dar lugar ao estilo claro, conciso, isento de expressões de servilismo, de formas obsequiosas, indiretas e pedantes, ou de qualquer insinuação no sentido de que existe autoridade superior à razão e à ordem estabelecida pelas leis - um estilo que adote atitude natural em relação às autoridades subalternas.
Não deve haver frases convencionais, nem desperdício de palavras."
O texto continua válido para a esmagadora maioria das pessoas que ocupam repartições públicas em pleno século XXI.
Mesmo passados dois séculos de redação da circular, ainda se desconhece o que são as maneiras simples e naturais, decência, genuína seriedade, clareza, isenção de expressões servis. Isso nos menores níveis do organograma do poder público. Quanto mais se 'eleva' a função, pior fica o entendimento.
Quem ocupa cargo eletivo, nos tempos que chamamos modernos, se parece mais com discípulos aplicados dos tipos de governantes que deveriam ser esquecidos em suas formas de governos e não imitados ao pé da letra.
Prefeitos, vereadores, deputados, governadores, senadores, presidentes da República, embora sejam apenas funcionários públicos com respeitáveis salários, mais se parecem com os reis e rainhas que dominavam à revelia do povo e que a este mesmo povo que os aclamava tratavam como lacaios.
A circular bicentenária apresenta traços do que se convencionou chamar de "cidadania" tal qual idealizada pelos gregos na Grécia antiga. Contudo, esta cidadania ainda não foi sequer entendida, quanto mais exercida pela imensa maioria da população mundial.
O texto tem um tom levemente jocoso acerca das ideias que, naquele momento da Revolução Francesa eram consideradas superadas e dignas de esquecimento. "Sabemos que as velhas formas de governo já desapareceram: devemos até esquecer como eram." Critica-se aqui o poder absolutista dos reis, por exemplo, que nesta época já não tinham a hegemonia da aceitação popular e nem contavam com unanimidade entre os membros das cortes.

A observação do passado sempre serve para que se possa agir melhor no presente e, assim, ter um planejamento mínimo para o futuro. Contudo, a maior parte dos nossos governantes, em todas as esferas, são ignorantes o suficiente para sequer conhecer os valores éticos e morais que deveriam ser intrínsecos de suas personalidades. Se não têm conhecimento ou não reconhecem sua importância, como poderão exercê-los?
 

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