Dependemos de mãos alheias, do nascimento à morte
Quando a nossa sanidade está sob risco, tentamos nos convencer que somos auto-suficientes, independentes e pretensamente superiores. Após o juízo ser restabelecido, normalmente pelos tombos ao longo da vida, percebemos o quanto precisamos uns dos outros.
Essa é uma condição que nos acompanha desde o nascimento. Neste momento é certo que nos esforçamos para sair da primeira casa, o útero, mas se a mãe não fizesse aquele esforço hercúleo, a parceria do nascimento não se estabeleceria.
Além de mãe e filho há sempre alguém para ajudar. Nos tempos antigos existiam as parteiras. A modernidade ajudou a aumentar o número de mãos trabalhando na concepção. Enfermeiros, médicos, até pais menos covardes, e com um pouquinho mais de dinheiro, podem não ajudar, mas acompanhar o milagre da vida. A 'grande' ajuda deles é ficar dizendo no ouvido da esposa: 'amor, você consegue'. Enquanto ele se contorce mais que ela.
A dependência de mãos alheias continua depois do primeiro choro. Alguém pega nos braços, limpa, coloca no peito da mãe para o primeiro contato, leva para o banho e devolve à mãe ainda descabelada. Sem as mãos dos milhões de profissionais da saúde que se dedicam nisso, as mães ficariam loucas sem saber onde estaria seus rebentos e os recém-nascidos sem perspectivas.
Só para encurtar caminho, dependemos das mãos alheias até depois de mortos. Sem elas nossa casa terrena, o corpo, ficaria exposto sem o mínimo de respeito. São pelas mãos dos outros que os corpos são guardados para voltar ao pó como era. Mórbido de minha parte? Acredito que não. Afinal, esta é uma das poucas certezas da vida: a partida.
Da casa que moramos à alimentação diária seja ela em casa, na cozinha da empresa ou nos restaurantes, em tudo há trabalho feito por mãos de terceiros. Se temos uma cidade limpa para transitar, alguma mão se empenhou nisso. Se há ruas e avenidas projetadas, grandes e pequenas construções, escolas, hospitais, museus, teatros, cinema, lojas, enfim, em tudo atuaram mãos que desconhecemos. Desde a mão do arquiteto, que pôs o sonho da cabeça de alguém na prancheta, até o pedreiro que deu forma à construção.
Independente de nossas mãos serem reconhecidas ou não, é de bom tom, pelo menos reconhecermos as mãos alheias. A colheita pode demorar, mas é certa.
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